"Portugal atravessa um dos momentos mais difíceis da
sua história que terá que resolver com urgência, sob o perigo de deflagrar
crescentes tensões e consequentes convulsões sociais.
Importa em primeiro lugar averiguar as causas. Devem-se
sobretudo à má aplicação dos dinheiros emprestados pela CE para o esforço de
adesão e adaptação às exigências da união.
Foi o país onde mais a CE investiu "per capita" e
o que menos proveito retirou. Não se actualizou, não melhorou as classes
laborais, regrediu na qualidade da educação, vendeu ou privatizou mesmo
actividades primordiais e património que poderiam hoje ser um sustentáculo.
Os dinheiros foram encaminhados para auto-estradas, estádios
de futebol, constituição de centenas de instituições público-privadas,
fundações e institutos, de duvidosa utilidade, auxílios financeiros a empresas
que os reverteram em seu exclusivo benefício, pagamento a agricultores para
deixarem os campos e aos pescadores para venderem as embarcações, apoios
estrategicamente endereçados a elementos ou a próximos deles, nos principais
partidos, elevados vencimentos nas classes superiores da administração pública,
o tácito desinteresse da Justiça, frente à corrupção galopante e um desinteresse
quase total das Finanças no que respeita à cobrança na riqueza, na Banca, na
especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, em contrário, uma atenção
especialmente persecutória junto dos pequenos comerciantes e população mais
pobre.
A política lusa é um campo escorregadio onde os mais hábeis
e corajosos penetram, já que os partidos cada vez mais desacreditados,
funcionam essencialmente como agências de emprego que admitem os mais corruptos
e incapazes, permitindo que com as alterações governativas permaneçam,
transformando-se num enorme peso bruto e parasitário.
Assim, a monstruosa Função Publica, ao lado da classe dos
professores, assessoradas por sindicatos aguerridos, de umas Forças Armadas
dispendiosas e caducas, tornaram-se não uma solução, mas um factor de peso nos
problemas do país.
Não existe partido de centro já que as diferenças são apenas
de retórica, entre o PS (Partido Socialista) e o PSD (Partido Social
Democrata), de direita, agora mais conservador ainda, com a inclusão de um novo
líder, que tem um suporte estratégico no PR e no tecido empresarial abastado.
Mais à direita, o CDS (Partido Popular), com uma actividade assinalável, mas
com telhados de vidro e linguagem publica, diametralmente oposta ao que os seus
princípios recomendam e praticarão na primeira oportunidade. À esquerda, o BE
(Bloco de Esquerda), com tantos adeptos como o anterior, mas igualmente com uma
linguagem difícil de se encaixar nas recomendações ao Governo, que manifesta um
horror atávico à esquerda, tal como a população em geral, laboriosamente
formatada para o mesmo receio. Mais à esquerda, o PC (Partido comunista)
menosprezado pela comunicação social, que o coloca sempre como um perigo
latente e uma extensão inspirada na União Soviética, oportunamente extinta, e
portanto longe das realidades actuais.
Assim, não se encontrando forças capazes de alterar o
status, parece que a democracia pré-fabricada não encontra novos instrumentos.
Contudo, na génese deste beco sem aparente saída, está a
impreparação, ou melhor, a ignorância de uma população deixada ao abandono,
nesse fulcral e determinante aspecto. Mal preparada nos bancos das escolas, no
secundário e nas faculdades, não tem capacidade de decisão, a não ser a que lhe
é oferecida pelos órgãos de Comunicação. Ora e aqui está o grande problema
deste pequeno país; as TVs as Rádios e os Jornais, são na sua totalidade,
pertença de privados ligados à alta finança, à industria e comercio, à banca e
com infiltrações accionistas de vários países.
Ora, é bem de ver que com este caldo, não se pode cozinhar
uma alimentação saudável, mas apenas os pratos que o "chefe"
recomenda.
Daí a estagnação que tem sido cómoda para a crescente
distância entre ricos e pobres.
A RTP, a estação que agora engloba a Rádio e TV oficiais,
está dominada por elementos dos dois partidos principais, com notório assento
dos sociais-democratas, especialistas em silenciar posições esclarecedoras e
calar quem levanta o mínimo problema ou dúvida. A selecção dos gestores, dos
directores e dos principais jornalistas é feita exclusivamente por via
partidária. Os jovens jornalistas, são condicionados pelos problemas já
descritos e ainda pelos contratos a prazo determinantes para o posto de
trabalho enquanto, o afastamento dos jornalistas seniores, a quem é mais difícil
formatar o processo a pôr em prática, está a chegar ao fim. A deserção destes,
foi notória.
Não há um único meio ao alcance das pessoas mais
esclarecidas e por isso, "non gratas" pelo establishment, onde possam
dar luz a novas ideias e à realidade do seu país, envolto no conveniente manto
diáfano que apenas deixa ver os vendedores de ideias já feitas e as cenas
recomendáveis para a manutenção da sensação de liberdade e da prática da
apregoada democracia.
Só uma comunicação não vendida e alienante, pode ajudar a
população, a fugir da banca, o cancro endémico de que padece, a exigir uma
justiça mais célere e justa, umas finanças atentas e cumpridoras, enfim, a
ganhar consciência e lucidez sobre os seus desígnios.
Jacques Amaury
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