domingo, 18 de novembro de 2012

Tarrafal


O campo de concentração do Tarrafal era um rectângulo de arame farpado contornado por uma vala de 4 metros de largura e profundidade.
Ficava entre montes escarpados, sem vegetação.
Havia um talude de 3 metros feito de terra e onde estava instalada uma metralhadora.
Uma ponte de madeira era a única entrada e saída do campo. Dum lado e do outro estão dois fortins.
Dentro do campo existem 4 barracões sem higiene, barracas de madeira que funcionam como oficinas, balneário e uma cozinha, tudo sem condições de asseio.
Havia algumas árvores no recinto.

Em 29 de Outubro de 1936 chegaram os primeiros presos da ditadura, vindos de outras prisões, como Caxias e Peniche, em condições desumanas.
Ao fim de dois anos as barracas apodreceram, e os prisioneiros eram obrigados a consertá-las o único edifício de pedra era a cozinha, e mesmo assim inacabada.
Dentro das barracas não havia luz. A comida era intragável, que por vezes os presos comiam com miolo de pão nas narinas por causa do mau cheiro.
Os presos eram obrigados a trabalhar numa pedreira. Depois do trabalho não havia água para se lavarem, nem para lavar a roupa.  Não havia médico, nem enfermeiro, nem medicamentos.
Um dia um cão ficou amigo dos presos, e um guarda decidiu abatê-lo com um tiro no crânio.

Em 12 de Julho de 1937 chegaram novos 41 presos, a juntar aos primeiros 150.
O barracão que servia de sala de instrução foi desmantelado.
A 2 de Agosto dá-se a primeira tentativa de fuga. 16 presos forma metidos no “segredo”. O edifício tinha 7 metros de comprimento e 3,5 de largura coberto por cimento armado, dividido em 2 divisões. É a chamada “frigideira”. A luz e o ar entram por 3 buracos feitos na porta de ferro, e por um pequeno rectângulo aberto junto ao tecto. Durante o dia o ar aquece lá dentro e torna-se irrespirável, os presos tem de se despir para suportar o calor. A tortura passa por privar os presos de água e comida.
Ai, são obrigados a passar mais de 10 dias e que podem chegar aos 50. Não são permitidos banhos e as necessidades são feitas numa lata, que com o calor faz um cheiro horrível, e a urina a evaporar faz arder os olhos. Revezam-se junto aos buraquinhos da porta para poderem respirar.
De noite os mosquitos invadem as celas. De dia eram espancados, e os corpos doíam deitados no chão de terra dura. Durante o dia os buraquinhos da porta eram tapados para torturar ainda mais os prisioneiros. A água da lata com o calor apodrecia.
Só pela madrugada a porta arrefecia e os presos encostavam-se a ela, para se refrescarem. Com tudo isto as doenças vinham. Era no chão, completamente nus, que agonizavam, entre picadas das formigas.
Durante 6 meses foram proibidos de escrever ás famílias. A ração de água foi também diminuída.

No dia 4 de Agosto os doentes forma obrigados a estar 4 horas ao sol.
Com o tempo o calçado gastou-se e os presos tinham de andar descalços. Deixou de haver papel higiénico, e os presos passaram a usar roupa para se limparem, camisas e até lençóis.
Começaram a vir os vómitos devido a má alimentação. Os indígenas foram proibidos de entrar no campo, com receio de haver uma epidemia na ilha.

A 20 de Setembro começaram a morrer presos. Os caixões eram feitos pelos outros presos, que trabalhavam dia e noite, para que os corpos dos companheiros de infortúnio não apodrecessem. Só no dia 30 de Setembro se soube dos primeiros 6 mortos do campo.
A 29 de Outubro as mortes recomeçaram. Em 17 de Novembro, Manuel Martins dos Reis é afastado de director da prisão do Tarrafal, acusado de roubar o estado. Os livros das contas da prisão desapareceram.
Foi nomeado director José Júlio da Silva e as condições melhoraram.
A esposa de um oficial ofereceu 2 cães aos presos, mas um deles, que se virava aos guardas em defesa dos presos, foi levado para ser enforcado, e deram-lhe 2 tiros na cabeça. Sobreviveu e foi tratado em segredo pelos presos, mas foi de novo apanhado e enforcado com arame farpado.
Dia 20 de Janeiro as mortes recomeçam. O médico era indiferente parente os doentes, controlando e sonegando os medicamentos.

Em 19 de Outubro de 1938 José Júlio da Silva é substituído por João da Silva.
Este carrasco tratou logo de piorar as condições dos prisioneiros. Começaram os castigos em série e os espancamentos.
Durante os dois anos de comando a “frigideira” nunca esteve vazia, para onde iam os presos por motivos sempre ridículos. Os carrascos eram sempre estúpidos e incultos.
A 6 de Julho de 1940 foi substituído por Duarte Osório Fernandes.

Em condenações finavam, mas os presos não eram libertos, alguns ficaram presos mais 6 anos do que a pena, muitos morreram depois de cumprir pena.